21 julho 2006

Passarinho verde é vermelho...

Saio do estágio, vou até um shopping center. Passeio pelas lojas, com olhar distante, apenas procurando algo interessante, matando o tempo. Entro numa loja de perfumes, e ali fico, experimentando uma dúzia deles, até achar aquele que eu havia encontrado uma semana atrás: apenas pelo cheiro, não pelo nome, ou cor da embalagem. Saio da loja com o perfume em mãos e trinta reais a menos no bolso. Paro em uma loja de vestuário, passeio pelas roupas em busca de blusas que me agradem. Seleciono três, vou ao provador, e de lá saio com duas. Saio do shopping, com mais cinqüenta reais a menos nos bolsos, e vou direto pra casa... No meio do caminho eu fico ali, de cabeça recostada no corrimão, pensando em como anda o meu coraçãozinho, por esses dias um pouco mais feliz, é verdade. Pensando em alguém que me corresponde, pensando adolescentemente naquela que pôs um sorriso em meu rosto... Chego em casa, dou feliz aniversário a minha mãe, e ainda de bom humor, lhe digo: "Nem olhe pra essas sacolas, que o presente é pra mim". E realmente era... Não havia encontrado nenhum perfume que a agradasse, ou aquele DVD que ela tanto queria... Checo o fogão, e ainda havia um pouco do almoço do qual eu não participei. Janto, troco de roupa e sento no sofá para assistir um pouco de TV. Minha mãe me chama, querendo ter uma conversa.... Isso me soou estranho, não me lembrava de ter feito algo errado. Respirei fundo, levantei-me e entrei no quarto dela. "Lá vem bomba", pensei. E estava certo. Os próximos cinqüenta minutos seriam quase eternos... Deitei-me na cama dos meus pais, onde ela também estava. Começou perguntando quem era aquela mulher com quem eu tanto saía (duas vezes, apenas). Não quis lhe dizer, ela havia me pedido segredo. Porém, minha mãe já sabia quem ela era, disse-me o seu nome, e eu apenas confirmei. "Eu não disse nada", pensei. Estava curioso pra saber quem havia lhe dito, mas ela não contaria, ao menos por agora. Iniciou dizendo que as pessoas do bairro onde eu moro estavam a cochichar ao meu, digo, ao nosso respeito (meu e daquela) pelas esquinas. "Nunca liguei para o que as pessoas falam sobre mim, sempre estive em paz com o que fiz e faço", disse pra mim mesmo. Perguntou-me porque eu não havia lhe dito nada, e eu apenas lhe disse que ela fala demais. E realmente fala... Depois de contar como ela havia confirmado as suas suspeitas (e não quem havia lhes confirmado), ela dedicou-se a descrever a situação da família daquela mulher. Eu, não ingênuo de todo, sabia de algumas coisas, não muito boas, é verdade, mas alheias aos meus interesses. Além do mais, como eu poderia saber daquilo, já que passo quase dezesseis horas fora de casa? Minha mãe discorreu vários minutos falando sobre o que as pessoas sabiam ou aumentavam a respeito de cada um dos membros daquela família. Escândalos, fofocas, fatos, suspeitas, e a cada uma delas meu bom humor era, pedaço a pedaço, trocado por um desânimo estarrecedor. "O povo aumenta, mas não inventa", dizia ela. E eu concordava com isso. Depois daquele discurso todo feito em baixo tom, dedicou-se mais um pouco a falar sobre a vida amorosa daquela mulher. Eu também sabia algumas coisas a esse respeito (tudo pela boca de terceiros), mas, novamente, alheias ao meu interesse. Por um momento, pensei que ela havia achado um modo de me fazer ficar longe daquela mulher, mas vi o contrário em seu tom de voz. Mudei o meu estado de descrença para um estado nulo, difícil de segurar, apenas para ter forças para ouvir mais um pouco semnada dizer. Depois de tudo dito, ela enfatizou a sua intenção em me chamar para aquela conversa. Nada de sermões, recriminações, puxões de orelha, nada. Apenas: cuidado. Minha mãe sempre viu em mim maturidade que a maioria das pessoas de mesma idade que eu não tinha, e isso desde pequeno. Sabia que eu pesava muito as minhas ações, para que não os desapontassem (meus pais). Ainda assim, cobrou-me cuidado. Perguntou-me "Você tem maturidade pra manter um relacionamento como esse?". Respondi-lhe "Tenho, minha mãe. E se não tenho, vou ter que arranjar." Ela sempre teve medo de que eu me apaixonasse por uma dessas mulheres ditas "destruidoras de lares". Daquelas que desestruturam uma familia inteira, em troca de alguns trocados. Aquela com quem eu saia não se enquadrava nessa categoria, até porque eu não tenho dinheiro algum. Eu também sabia que ela não a estava classificando dessa maneira. Apenas disse que ela era volúvel. Parei, e pensei um pouco nisso... Aquela mulher, linda, havia me dito, antes de tudo, que eu não me envolvesse, que tinha medo de me fazer sofrer... Eu pedi para que ela não se preocupasse com isso, pois se tudo que nós tínhamos para viver valesse a pena, eu não me importaria de sofrer o tanto que fosse (romântico, como sempre...). Voltei, então, para o mundo real, e entendi tudo o que havia ouvido nos cinqüenta minutos anteriores. Minha mãe me lembrou, mais uma vez, de todos os sonhos que eu tenho, do que eu havia feito até ali para ficar ainda mais próximo deles, e, pela quarta vez, pediu-me cuidado. "Você tem muito a perder com isso (...) Não vou impedir você de viver essa aventura". Encerrou a conversa, dando-me um abraço (o quarto deste ano), e abrindo a porta do quarto, que estava fechada. Saí, fui até o meu quarto, liguei o computador, identifiquei-me e fui ouvir aquelas músicas que me faziam pensar, divagar sobre minhas próprias questões. Fiquei mais um bom tempo sozinho. Meu corpo, ausente de reações, deitado sobre a cama de solteiro, olhava pro nada... Hoje de manhã, fiz tudo o que sempre faço, até fechar o cadeado do portão da frente de minha casa. Fui caminhando devagar, olhando para o chão, e ainda pensando no que a minha mãe havia me dito, até que a mesma mulher de quem falávamos apareceu, subindo o mesmo caminho para o ponto de ônibus. Ficamos ali, no ponto, ela naturalmente sorridente, e eu disfarçando um estado de apatia iminente, usando poucas palavras. Subimos no mesmo ônibus, sentamos lado a lado, e senti na pele o que a minha mãe havia me dito: as pessoas no ônibus nos olhavam com olhos meio estranhos. Não quis encará-las, e me sentei, como sempre, ao lado dela. Desta vez, nada de envolver seus ombros com meus braços, oferecer-lhe meu ombro como travesseiro. Apenas um olhar distante, pensamentos tão quanto, um rosto disfarçadamente triste, e o amanhecer na janela. Uma hora e meia depois, ela se dispede, dando-me um beijo no rosto, tomando o caminho do trabalho. Eu ali, isolado de mim mesmo, sentindo tudo o que havia me feito sorrir de novo esvair-se por entre as mãos. "Que seja eterno enquanto dure", pensei comigo mesmo. Não ficaria ali, pensando besteira. Desci do ônibus no meu ponto de parada, e fui caminhando devagar até onde estou agora, escrevendo. Ainda pensando besteira, não pude evitar. Só espero que eu realmente consiga fazer com que seja eterno enquanto dure o fio de deslumbramento que nos cerca...
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